Frequentemente sou confrontado com uma observação que me causa algum incómodo, a de que determinada pessoa até gosta de filosofia, mas que precisa de fazer algo mais prático e, em razão disso, prefere estudar psicologia ou medicina. A perplexidade que me causa este tipo de observação é só uma: é que escolhi estudar filosofia precisamente por me considerar uma pessoa muito prática. Penso que é bom procurar definir aquilo que estamos a pensar quando nos referimos ao que é e não é prático. No sentido comum em que esta afirmação é feita, a característica de “prático” não pode ser atribuída a quase nenhum saber. Por prático entendem as pessoas, “fazer coisas”. Ora, na filosofia aquilo que fazemos é pensar como fazer coisas, por exemplo, como fazer ciência na filosofia da ciência. Claro que enquanto estamos a pensar como fazer coisas, não estamos, na verdade, a fazer coisas. Mas o que cabe aqui perguntar é se é possível fazer coisas sem antes pensar como as fazer? Claro que é, mas tem de existir sempre alguém que pense como fazer coisas para que outros as possam fazer. Aqui a opção entre o que é prático e não prático faz sentido, mas é pouco razoável que alguém desvalorize a filosofia de forma completa só porque pensa que o melhor que tem a fazer na vida é “fazer coisas”. Para além disso aparece aqui uma questão mais metafísica: e pensar como fazer coisas não é em si fazer coisas? Eu defendo que sim, mas é verdade que a generalidade das pessoas pode não o considerar desse modo. Mas a minha hipótese é que fazer filosofia ou, pelo menos, pensar filosoficamente é fazer coisas e que, mexer nas coisas só é compreensível se nos for dada a possibilidade de pensar em como as mexer antecipadamente. Será a minha hipótese aceite pacificamente?
22 de novembro de 2008 ⋅ Blog
Fazer filosofia é fazer coisas
Rolando Almeida
Frequentemente sou confrontado com uma observação que me causa algum incómodo, a de que determinada pessoa até gosta de filosofia, mas que precisa de fazer algo mais prático e, em razão disso, prefere estudar psicologia ou medicina. A perplexidade que me causa este tipo de observação é só uma: é que escolhi estudar filosofia precisamente por me considerar uma pessoa muito prática. Penso que é bom procurar definir aquilo que estamos a pensar quando nos referimos ao que é e não é prático. No sentido comum em que esta afirmação é feita, a característica de “prático” não pode ser atribuída a quase nenhum saber. Por prático entendem as pessoas, “fazer coisas”. Ora, na filosofia aquilo que fazemos é pensar como fazer coisas, por exemplo, como fazer ciência na filosofia da ciência. Claro que enquanto estamos a pensar como fazer coisas, não estamos, na verdade, a fazer coisas. Mas o que cabe aqui perguntar é se é possível fazer coisas sem antes pensar como as fazer? Claro que é, mas tem de existir sempre alguém que pense como fazer coisas para que outros as possam fazer. Aqui a opção entre o que é prático e não prático faz sentido, mas é pouco razoável que alguém desvalorize a filosofia de forma completa só porque pensa que o melhor que tem a fazer na vida é “fazer coisas”. Para além disso aparece aqui uma questão mais metafísica: e pensar como fazer coisas não é em si fazer coisas? Eu defendo que sim, mas é verdade que a generalidade das pessoas pode não o considerar desse modo. Mas a minha hipótese é que fazer filosofia ou, pelo menos, pensar filosoficamente é fazer coisas e que, mexer nas coisas só é compreensível se nos for dada a possibilidade de pensar em como as mexer antecipadamente. Será a minha hipótese aceite pacificamente?
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1 comentário :
Mais, só é útil "fazer coisas" quando estas são Remuneradas!
Quanto peno eu pelas minhas composições e escritos! Quantas horas gastei nos meus originais. No entanto enquanto não ganhar dinheiro "a sério" com eles, para todos os efeitos, andei a "fazer nada" e a "ser um inútil".
Em compensação, andando a dar aulas a putos, mesmo que não seja tão original nem gratificante para mim como compor material original estou a "ser útil" e a "fazer coisas" porque se "vê algo ao fim do mês".
Metam isto na cabeça: para os comuns dos mortais, fazer qualquer coisa é impreterivelmente ganhar dinheiro. Se não dá dinheiro é inútil...
Que mundo :/
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