Qualquer escolha dos livros mais
significativos do ano começa por ser algo subjectiva. Digo “algo” e não
“totalmente” pois há livros que são de importância decisiva para qualquer boa
escolha. Assim, se escolher o livro de Ben Dupré na minha lista pode depender
mais das minhas opções particulares no que respeita à divulgação e estudo da
filosofia, o mesmo julgo não acontecer com edições como as de Anthony Kenny,
essenciais a qualquer bom estudo que se pretenda fazer de filosofia com livros
traduzidos ou escritos directamente em língua portuguesa. Em termos de quantidade as coisas são
sempre reduzidas já que o nosso diminuto mercado não coloca grandes dilemas
sobre o que escolher. Como tenho feito ao longo dos últimos anos, de seguida
apresento os livros de filosofia que, no ano 2011, foram publicados em Portugal
e que melhor contribuíram para o meu estudo contínuo deste maravilhoso e
infindável saber.
Anthony
Kenny, Nova História da Filosofia
Ocidental, 4 Volumes (Gradiva), Tradutores: Pedro Galvão, Fátima Carmo
(Vol i), António Infante (Vol ii), Célia Teixeira (Vol iii) e Cristina Carvalho
(Vol iv). Revisão de Aires Almeida
A Nova História da Filosofia
Ocidental começou a ser publicada em língua portuguesa ainda no ano de 2010,
sendo que somente os 2 últimos volumes foram publicados em 2011. Mas temos de
novo uma história da filosofia actualizada. Mas esta história da filosofia é
muito mais que uma história dos filósofos e das suas ideias. Trata-se de uma
verdadeira obra de filosofia, uma vez que os problemas são discutidos como num
bom livro de filosofia. Uma obra fundamental para quem se interessa pela
filosofia e a sua história.
É um livro arrojado, mas provavelmente
um dos que em 2011 mais me influenciou. A tese central é que nos tempos que
correm vale a pena regressar a algum pessimismo coincidente com algumas ideias
da direita tradicional. Scruton dá-nos razões para pensar que o optimismo
desenfreado pode não constituir a saída mais adequada para os problemas
políticos que assistimos hoje em dia. Dá que pensar.
Numa boa tradução esta edição é
muito significativa já que, até à data, não dispúnhamos de qualquer boa edição
contemporânea de introdução à filosofia da religião. O livro é de leitura
acessível, sem perder pitada de rigor, o que significa que é acessível mesmo a
quem não tem formação em filosofia. E trata de problemas que interessa a
qualquer ser humano expondo os argumentos principais e respectivas objecções.
Isto para além de ser uma leitura que permanentemente questiona o leitor e
coloca as suas crenças à prova.
O ano de 2011 arrancou em Janeiro
logo com uma edição de filosofia escrita em português do nosso colega e amigo
Desidério Murcho. Pela primeira vez entramos numa cadeia de super mercados (do
grupo da Fundação que publicou este ensaio e que também fez a distribuição do livro a par com as livrarias tradicionais) e deparamo-nos com um livro com o
nome Filosofia em Directo. E de facto é nisso que consiste a proposta de
Desidério neste pequeno grande livro, um contacto directo com as questões
filosóficas contemporâneas.
Um pouco na continuação de
Filosofia em Directo, 7 Ideias filosóficas pega em algumas máximas famosas da
filosofia e lança o mote para o desafio de pensar filosoficamente pela própria
cabeça. De salientar a escrita do autor que está cada vez mais clara, cada vez
mais apurada. Um bom livro de filosofia que pode servir de referência em
qualquer contexto onde se faça filosofia. E um livro de um dos autores mais
produtivos na filosofia em língua portuguesa.
A ideia que passa na maioria dos
cursos de filosofia em Portugal sobre a filosofia da existência, muitas das
vezes reduz-se a escritos de Heidegger e Sartre. Mas há mais, muito mais para
estudar nessa área da filosofia. E este livro é uma boa porta de entrada à
discussão contemporânea desses problemas, indo mais além do que os lugares
comuns da Universidade Portuguesa.
Um dos principais textos
introdutórios a esta área da filosofia, a filosofia da mente, agora disponível
numa boa tradução. McGinn é um filósofo já com dois ou três livros traduzidos e
um dos filósofos vivos mais apetecíveis do nosso tempo.
Creio que Peter Singer dispensa
apresentações. É na minha opinião – e de muitos – um filósofo notável, com uma
invulgar mas desejável capacidade de nos deixar a filosofar sem que nos demos
conta de que estamos a fazê-lo. Neste livro Singer dá-nos algumas razões para
pensar que temos a obrigação moral de ajudar os povos mais pobres. Este livro
deu, em Portugal, origem a uma página no Facebook, com centenas de amigos, com
o nome do Livro.
Bem
Dupré, 50 ideias de
filosofia que precisa mesmo de saber, D. Quixote, Tradutor. Jorge
Pereirinha Pires
Este foi talvez o melhor livro
que conheci de divulgação de filosofia traduzido em 2011 que dá uma ideia correcta do que se faz nas mais
diversas áreas da filosofia. Pertence a uma colecção que está a ser publicada
pela D. Quixote e trata-se de uma pequena obra que se recomenda como mini
enciclopédia de filosofia. Nota-se um ou outro atropelo na tradução que
enganará o leitor desprevenido.
Este livro poderia aparecer logo no topo. É simplesmente o livro que mais
gostei de ler de filosofia em 2011. Justiça é a compilação das aulas de Sandel
em Harvard, onde lecciona. É extraordinário como se pode escrever filosofia
deste modo. Aconselho vivamente a ler o capítulo sobre Kant e descobrir como é
que se pode explicar Kant, um autor complexo, de um modo impecável, sem
qualquer tropeção. É um livro de filosofia claramente acima da média.
A.
C. Grayling, O livro
dos livros, uma Biblia humanista, Lua de Papel. Tradutores: Ana Filipa Vieira, Carlos Leone, Joana Custódia
Jacinto, Rosa Maria Fina e Rosalinda Rodrigues da Silva.
Não é bem um livro de filosofia,
mas uma Bíblia alternativa à Bíblia da revelação. Trata-se de uma Bíblia
dirigida ao raciocínio e não à revelação ou à fé. O texto é disposto tal como
na Bíblia, em duas colunas. Mas é um livro dirigido ao grande público e a
pessoas que gostam de pensar activamente.
6 comentários :
PROVAVELMENTE, numa lista de livros de filosofia, faria mais sentido incluir, em vez de "O livro dos livros", outros como "Uma viagem com Platão".
Digo eu...
(Um ótimo 2012, para o Rolando e para toda a equipa do ótimo blogue e do sítio da Crítica)
Também não vi filosofia alguma neste livro do Grayling, mas só li algumas partes.
E não é um livro de filosofia. Grayling parece querer mostrar que o que de bom se encontra na Bíblia se pode encontrar, para melhor ainda, noutros livros, sem termos de pagar o elevadíssimo preço da fé.
Obrigado pelos vossos comentários. Não tenho resposta a dar pois creio que já a dei na abreviatura que escrevi ao livro.
Gomes, não li o livro que falas. Mas tens razão, provavelmente ficava ali melhor que o de Grayling. Há uma razão oculta para eu ter seleccionado o Grayling. É que é uma forma de divulgar um filósofo que, na minha opinião, é provavelmente dos filósofos actuais que melhor comunica a filosofia. Os poucos livros que li dele são notáveis e ele é muito versátil. A exemplo, a Biografia que ele fez do Descartes (Europa America) é um belíssimo livro e está publicada em português.
Tenho uma questão, mas não sei bem em que contexto a endereçar, mas pronto, fica aqui... Sempre que vejo na Crítica posts relativos aos últimos livros publicados, ou a dar conhecer alguns filósofos, ou colóquios, etc., etc., parece-me que é ignorado todo o trabalho filosófico realizado em Coimbra. É verdade? Se sim, há algum motivo para isso?
Ver aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui.
Publicar um comentário